25 momentos que deram fôlego a 2016 - Parte 3

Riri Williams, a Iron Heart, e Ariell Johnson


Invencível Homem de Ferro /Invincible Iron Man (Riri Williams)
Marvel (2016 - em andamento)
Brian M. Bendis

Uma das maiores polêmicas que envolveram a comunidade nerd em 2016 foi a notícia de que o clássico Homem de Ferro (Tony Stark) seria substituído pela jovem negra Riri Williams. Aqueles fãs "clássicos", acostumados a serem medida do mundo não receberam a notícia. Nós, por outro lado, celebramos a possibilidade, mas com certa desconfiança, afinal a Marvel nunca deu "ponto sem nó". Semanas antes do lançamento da revista, o artista J. Scott Campbell divulgou uma capa em que a garota aparece sexualizada. Após uma chuva de críticas, o autor voltou atrás em sua "OPINIÃO". Apesar do desgaste promovido por essa questão, primeiro veio a belíssima notícia de que a edição de estréia teria uma capa variante com a protagonista Riri Williams tomando café na Amalgam Comics & Coffeehouse (Filadélfia) com a proprietária, Ariell Johnson, uma mulher Negra, Nerd fã dos X-Men! 

Outro ponto a comentar é a revista em si [ainda inédita no Brasil]. Brian M. Bendis é o roteirista mais cotado da Marvel há algum tempo, e tem sido peça chave na discussão sobre representação de minorias nos quadrinhos mainstream. O primeiro volume mostra o background, a genialidade e a família de Riri e a segunda se preocupa em apresentar a motivação de Riri. É interessante ressaltar que a narrativa se direciona muito mais à sensibilização daqueles nerds clássicos que poderiam não se identificar com a personagem apenas pela diferença física e de gênero e investe na exaltação de Stark, como uma forma de convencimento também. As ilustrações são lindas e a forma como a garota é descrita - salvo a síndrome do impostor - me envolveram bastante. Que tal uma heroína que se parece com você e luta pela sua causa? 





Má Feminista: Ensaios provocantes de uma ativista desastrosa 
Novo Século, 2016
Roxane Gay

Assim que começaram os rumores sobre a série da Marvel O Mundo de Wakanda [World of Wakanda - inédito no Brasil] eu fui procurar mais a respeito de Roxane Gay, uma mulher negra, de origem haitiana, feminista e crítica da cultura de massa. Assisti sua palestra no TedWomen intitulada Confissões de uma má feminisita e corri para ler seu Má feminista (2014) que foi lançado no Brasil em 2016. 

Apesar da tradução evidenciar, em vários momentos, a falta de familiaridade com as ideias da tradição de escritoras/feministas negras, isso não é um problema se você leitora, tiver. Apesar disso, há trechos em que a tradução é comentada e isso mostra que houve zelo da profissional, quem poderia ter pensado melhor é a editora. Os ensaios são leves e se dividem em relatos da vida de Gay, questões ligadas ao gênero e crítica de filmes e séries recentes como Vidas Cruzadas, Orange is the new Black e Django Livre, bem como o absurdo que muitas mulheres professam sobre aceitarem apanhar de Chris Brown. Os ensaios são curtos e envolventes, o que torna a leitura bastante agradável a qualquer pessoa interessada em pensar mais sobre a questão do feminismo interseccional sem por isso se martirizar. O título faz referência àquela culpa que a maioria de nós - feministas - sentimos sempre que desejamos ou agimos de forma oposta à construção do nosso projeto de sociedade.



Lundu,
Padê Editorial
Tatiana Nascimento

A publicação de Tatiana Nascimento é um presente feito à mão. Tudo começa com a embalagem dourada com traços vermelhos que é uma gravura de Leonardo Freitas. Como um polpo, a capa envolve o livro numa dobradura que enche os olhos e o tato. Na parte interior dessa embalagem artística há o editorial, o prefácio e o número da edição/tiragem. O livro lembra as autopublicações da geração mimeógrafo, que datilografavam seus versos que dobravam, cortavam, soldavam, brincavam com a linguagem e jogavam aos nossos pés sacadas da nossa língua que passam despercebidas. Nascimento parece beber de uma Alice Ruiz, Cacaso, Ana C e Leminski trazendo suas próprias referências de vida diaspórica negra, lésbica, latina, acadêmica, mas sensorial, cercando as zonas intersticiais. Lundu foi o melhor presente do ano passado, em todos os sentidos.



Advantageous
2015 [Netflix]
Jennifer Phang

Desde o início de 2016 eu havia marcado Advantageous na lista de interesse da Netflix. O filme é um drama familiar distópico protagonizado por Jacqueline Kim, que interpreta Gwen, mãe da jovem Jules. Gwen é "a cara" duma empresa e, para manter seu emprego é submetida à uma experiência drástica. O ponto alto da obra é a construção da relação entre a mãe e a filha e discussão sobre o racismo e o fantasma da eugenia. Esse talvez tenha sido a obra com a melhor representação de mulheres asiáticas que eu vi nos últimos anos. Sem dúvidas, foi a primeira em que presenciei o foco total no cotidiano e subjetividade de uma mulher com traços asiáticos sem estar ligada à tradição e com uma reflexão profunda sobre os efeitos do racismo na psique. O filme me fez pensar sobre a importância da nossa vida numa plataforma biológica não-branca é uma forma de resistência. Ser você mesma num mundo que tenta nos exterminar todos os dias é político, como afirmou Audre Lorde. Eu finalmente assisti, porque foi a melhor sugestão da mesa Furiosas! da CCXP.




Strange Empire
CBC Television, 2014-2015 [Netflix]
Laurie Finstad-Knizhnik

A série canadense Strange Empire não teve a repercussão que merecia: não apareceu nas grandes listas de "séries feministas", por mais que seja protagonizada por uma mulher indígena, uma negra e uma judia, todas rebeldes a seu modo e apesar dos estereótipos. O grande vilão é um privilegiado homem branco, mas uma série de situações aberrantes e curiosas cerca a história principal. Apesar de se passar em 1869, na fronteira entre os E.U.A e o Canadá, há uma discussão sobre gênero não-binário, interseccionalidade, racismo (direcionado a negros, asiáticos e indígenas), sexismo tão fértil que assisti a única temporada duas vezes só no carnaval! Foi a primeira série que eu assisti com uma protagonista indígena que foge ao padrão Pocahontas, no sentido identitário e político (ela é uma métis, "meio" indígena).  Apesar de o roteiro ser cheio de furos (ou de ganchos para a segunda temporada que não existiu), a trama apresenta elementos de literatura gótica, "velho oeste" [western] e de ficção científica clássica com o destaque de tudo girar em torno da experiência de mulheres de classes populares. Se, por um lado a série entrelaça muitos temas, muitos subplots e muito tudo, por outro, nunca assisti a uma série *com criadores racialmente diferentes de protagonistas* que desejasse tanto acertar!



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25 Momentos Que Deram Fôlego A 2016 – Parte 1 por Camila Cerdeira
25 momentos que deram fôlego a 2016 - Parte 2  por  Anne Caroline Quiangala


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