No Seu Pescoço – Uma Viagem Pela Escrita de Chimamanda

Chimamanda Ngoozi Adichie, gostaria de dizer que conheci o nome dela em alguma lista literária de autoras que você não pode morrer sem ler, mas a verdade é que conheci ela através de uma música da Beyoncé.

Na faixa Flawless a cantora utiliza um sample (trecho) do TedTalk da autora nigeriana intitulado Sejamos Todos Feministas, TedTalk que depois viraria livro de mesmo nome. E essa foi minha obra introdutória da autora e sendo bem honesta, foi a canção da ex Destiny’s Child que colocou Chimamanda no mapa da cultura POP.


Então surgiu um Leia Mulheres, projeto nacional onde são montados clubes do livro para incentivar a leitura de escritoras e o debate de sua obra. Na época morando em Fortaleza eu costumava participar dos encontros, um mês que não me recordo qual foi o livro escolho por votação para leitura foi Hibisco Roxo, primeiro romance da autora. Nada havia me preparado para o que iria encontrar naquelas páginas.

É o primeiro livro da autora, então no quesito técnica ele não é perfeito, mas eu não sou uma academicista de letras e tão pouco uma pedante literária para me importar que a cadencia das palavras em seus parágrafos deixou a leitura um tanto quanto enfadonha. Chimamanda Ngozi Adichie é uma mulher negra nigeriana escrevendo sobre a realidade negra. Obviamente ela tem um foco muito maior na realidade negra nigeriana, mas algumas vivencias são universais. Mesmo que nem todos os negros de países africanos tenham sido escravizados, eles foram catequizados. Existe um histórico de instabilidade política devido a invasão e a influência dos colonizadores e que leva a golpes militares, isso soa familiar?

Depois de anos lendo histórias de pessoas de pele branca e olhos claros que se passavam em estações que eu não conhecia, pois, o Ceará só se divide o tempo entre quente e abafado. Eu pude ler historias onde eu me reconhecia. E Hibisco Roxo é um soco no estômago dado sem aviso, um livro espetacular que eu terminei querendo pegar copias e distribuir na rua.

Depois li Americanah e a identificação de uma negra imigrante nos Estados Unidos foi enorme, não que eu tenho alguma vez imigrado para os Estados Unidos. Porém a assimilação era ainda mais próxima da minha realidade. O momento que a personagem descreve todo o processo de transição capilar e como ela entrou fórum de outras mulheres negras que passavam pelo mesmo e como aquilo criou uma comunidade de apoio onde elas trocavam dicas me trouxe gargalhadas de auto reconhecimento.

Venho tentando ler o máximo de livros que posso da autora e raras são as vezes que me arrependo. Só com Como Criar Crianças Feministas que senti falta de uma abordagem da questão LGBT, mas isso é papo para outro texto em outro dia.


Chegamos ao seu primeiro livro de contos publicado no Brasil, No Seu Pescoço. O Livro conta com 12 contos que variam entre 11 a 26 páginas. O conto abarca de forma muito sutil a vastidão de experiências negras que se pode ter, e fico feliz de relatar que pela primeira li escritos da autora com personagens LGBT, mais de um por sinal e com diferentes abordagens, ainda que de forma muito secundária.

Os contos vão desde o período que de 1885 quando ainda se capturava negros para escravizar e as igrejas, tanto católicas quanto evangélicas, chegavam a Nigéria descrevendo o impacto que elas tinham sobre as tribos até os dias atuais que os dilemas que algumas mulheres negras tem ao imigrar para os Estados Unidos. Passando também pelo período da Guerra da Biafra e como a instabilidade política atingiu a população nigeriana de diversas formas.

A equipe Preta Nerd tem uma iniciativa chamada #PretaRead. Onde montamos um grupo online para ler e debater leituras que tangem a negritude. Estamos atualmente debatendo No Seu Pescoço, estamos no oitavo conto (A Embaixada Americana), comentando um conto por dia. Se você não sabia da nossa iniciativa ou ainda não começou a ler não tem problema, pois todos os tópicos de contos anteriores são mantidos e o debate continua, é só chegar e deixar sua contribuição que a conversa continua. Para os interessados é só entrar no link aqui.

Sempre que me pediu uma indicação de por onde começar a ler a autora eu sempre indicava Americanah, que apesar de ainda conter alguns socos no estomago, traço característico da escrita da nigeriana, é uma leitura mais leve e tranquila que Hibisco Roxo, porém sabia que inibia devido ao tamanho do livro, é um calhamaço. Agora tenho um novo cartão de visitas para indicar, No Seu Pescoço é a introdução perfeita a escrita de Chimamanda Ngozi Adichie, que é sim uma das autoras que você precisa ler antes de morrer.
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