A Mídia e a Solidão da Mulher Negra



"Durante os 16 dias de ativismo na luta contra a violência à mulher, os blogs  Collant Sem Decote, Momentum Saga, Ideias emRoxo, Delirium Nerd, Vanilla Tree, Preta, Nerd & Burning Hell, Prosa Livre, Nó de Oito, Valkírias, Psicologia&CulturaPop, Iluminerd, Kaol Porfírio e Pac Mãe todos envoltos pelo #feminismonerd, se propuseram a discutir as problemáticas em torno da representação de mulheres tanto como uma matriz que reitera os discursos de violência e ódio, como veículos que visibilizam a discussão. Sabemos que, apenas a exposição e discussões possibilitam o combate direto, a resolução e identificação do problema. Como reitera a escritora e teórica feminista Audre Lorde : é preciso transformar o silêncio em linguagem e ação"

A violência não é caracterizada apenas da agressão física, mas também vem de forma simbólica, emocional e psicológica. Além disso, é preciso compreender que não existe uma hegemonia no que é ser mulher, mulheres não-brancas terão violências específicas causadas devido à intersecção de questões de gênero e raça, o mesmo acontece com mulheres não héteros ou mulheres trans.
E eu vim falar sobre um tipo especifico de violência simbólica, a tão conhecida Solidão da Mulher Negra. Essa solidão é um fator que vai atingir as mulheres negras independente de suas sexualidades, infelizmente ela é tão presente e naturalizada que ninguém se dá conta da sua constante reprodução no meio midiático.

Mas o que é a Solidão da Mulher Negra? É preciso compreender que nossa sociedade vive de uma forma hierarquizada onde no topo da cadeia social está o homem branco e no fundo está a mulher negra. Então socialmente nós, mulheres negras, somos a casta mais baixa, a mais oprimida, a menos desejada. Logo a mulher que é vista como troféu a ser ostentado socialmente é a mulher branca, que é uma mulher de primeira classe e não a mulher negra, que é vista como um ser de segunda classe.
Portanto o homem branco já naturalmente não nos procura para relacionamento romântico, ele é criado para casar com mulheres brancas. Acontece que muitos homens negros também não se relacionam com mulheres negras, por que muitas vezes para eles se envolver com uma mulher branca é sinal de ascensão social, que eles subiram no status quo. Além disso, existe o racismo institucionalizado que educa até pessoas negras a terem aversão a características negras, fazendo assim com que os traços negroides das mulheres negras não sejam atraentes e, assim elas são consideradas socialmente como feias.

E o que a mídia, o meio de entretenimento tem relação com isso? Ele normatiza esse comportamento, porque, muitas vezes a gente apenas reproduz o meio em que vivemos sem questionar.
Se você pegar o livro Hibisco Roxo da autora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, no final, vai se dar conta de que todas as personagens  femininas estão sozinhas, a protagonista até chega a dizer que o lado romântico dela não existe mais. Isso acontece porque a escritora recria o mundo ao seu redor e essa é a realidade das mulheres negras que a rodeiam, relacionamentos fracassados, relacionamentos abusivos onde a mulher negra se sujeita por achar que não vai encontrar outra pessoa, longos períodos de solidão e solteirice.


Essa mesma solidão é possível ser vestida em Grey’s Anatomy, série criada e roteirizada por Shonda Rhimes. Nas temporadas iniciais tínhamos apenas Miranda Bailey como mulher negra na série e os personagens demonstravam surpresa ao descobrir que ela tinha 10 anos de casada. Por que era inimaginável associar aquela mulher negra com uma vida romântica. Essa relação se mostrou tóxica e o marido de Bailey não deu qualquer suporte a personagem, os relacionamentos futuros continuaram trazendo os mesmos problemas onde o homem se sentem demasculinizados pela médica, sem demonstrar em momento algum a mesma consideração pela parceira que exigem.

Mais na frente tivemos a inclusão de mais duas personagens negras no elenco fixo da série. Dra. Edwards, ela chega a se envolver com o Jackson Avery, um médico negro, mas o mesmo a deixa para se envolver com uma médica branca. Meggie Pierce, que é uma personagem com destaque dramático, tem uma vida romântico praticamente ignorada ao contrario dos personagens brancos em posição de destaque.

Em How To Get Away With Murder, a personagem Annalise Keaton, interpretada por Viola Davis, começa com um casamento fracassado onde ambos traem e, nas temporadas seguintes, não consegue manter um relacionamento com ninguém, seja branco ou negro, homem ou mulher e termina em uma condição onde está sozinha e sem ninguém.



Nos quadrinhos, temos Luke Cage que, inicialmente, tinha um envolvimento com a Claire Temple, mulher negra, mas que só foi constituir família com Jessica Jones, uma mulher branca. O casamento entre T’challa (Pantera Negra) e Ororo (Tempestade), termina em uma separação.

E a lista poderia continuar, é um questionamento que nos faz perguntar qual é olugar da mulher negra no amor? Será que temos vez? E aqui entra a violência simbólica, crescemos com essas imagens na mídia de forma geral, no meio ao nosso redor e fica embutido nosso inconsciente de que não somos dignas de amor, que não somos boas o suficiente, que devemos ser gratas pelas migalhas que recebemos.

É através disso que surgem mulheres que se sujeitam a serem amantes ou a não serem assumidas publicamente. Que toleram agressões e abusos por acharem que não terão alguém além dessa pessoa ou que tudo que recebem é o que elas merecem exatamente por não serem boas o suficiente.

Quandoa mídia quebra esse padrão e coloca uma mulher negra numa posição de interesseamoroso, par romântico e de uma forma saudável é uma grande esperança, é a ideia de que esse ciclo vicioso possa ser quebrado.
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